Introdução: Esôfago negro (EN) é caracterizado pela coloração negra circunferencial e difusa, geralmente do terço distal da mucosa do esôfago.É mais comum em homens, raro e grave, com prevalência de até 0,2% e mortalidade de 13 a 35%.
Descrição do caso: J.M.C., feminina, 74 anos, diabética, asmática e portadora de neoplasia de reto médio estadio IV (cT2N2M1), submetida a retossigmoidectomia abdominal com excisão total do mesorreto, anastomose coloanal grampeada e ileostomia protetora, sem intercorrências, após 14 semanas da neoadjuvância com quimio (5‐fluoracil e oxaliplatina) e radioterapia (28 sessões, 50.4Gy) concomitantes.
O anatomopatológico evidenciou lesão ulcerada com fibrose estromal no reto, limites cirúrgicos distal (3,5cm) e circunferencial (2,5cm) livres, sem metástase (12 linfonodos avaliados). Apresentou boa evolução inicial, porém no sexto pós‐operatório (PO) evoluiu com sepse, epigastralgia e dor retroesternal, e eliminação de muco e pus via anal. TC de abdome confirmou a hipótese de deiscência parcial da anastomose, sem coleções, e EDA o diagnóstico de EN. O manejo foi realizado com NPO, hidratação, inibidor de bomba de prótons (IBP) em dose plena, antibiótico e antifúngico, endovenosos. Os dois últimos, mantidos por 14 dias. Em 24h foi iniciado sucralfato via oral e instalada nutrição parenteral (NPT). A resposta foi adequada, com reintrodução da dieta em 6 dias e retirada gradual da NPT. Recebeu alta após 20 dias, com IBP e sucralfato. Realizou EDA após 30 dias, sem alterações.
Discussão: O EN não possui etiologia definida, acredita‐se que isquemia e obstrução sejam os eventos iniciais. Também já foi associado a infecções, choque, uso de antibiótico, hiperglicemia, entre outros. 70% dos pacientes apresenta hemorragia digestiva alta (HDA) precoce. Disfagia, dor epigástrica e sepse são achados menos comuns. O diagnóstico é realizado com EDA e pode‐se encontrar lactato elevado, anemia, insuficiência renal, hiperglicemia e hipoalbuminemia. O manejo do EN consiste em suporte clínico, tratamento das doenças de base, sonda nasogástrica se obstrução, IBP, NPO por 24h e sucralfato VO após. Uso de antibiótico e antifúngico deve ser analisado individualmente. As complicações mais frequentes são: perfuração na fase aguda (7%) e estenose à longo prazo (25 a 40%).
Conclusão: Tendo em vista a gravidade associada, apesar de raro, o EN deve ser lembrado no PO de retossigmoidectomia, em pacientes com fatores de risco ou sintomas relacionados a esta patologia.